Luís das Neves Paiva

1903 - 1990

Fonte

Refrigério 21 (Ago/Set.1990)

LUÍS DAS NEVES PAIVA

Nasceu em 22 de Março de 1903. Faleceu em 29 de Agosto de 1990.

Nasceu e viveu até aos 9 anos no seio de uma família católica. Aos 9 anos foi convidado por um casal de crentes, que viviam perto, para ir a Igreja Evangélica. A partir daí a sua vida transformou-se, entregando-se ao Senhor.

A sua mãe era viúva e devido a dificuldades materiais, foi obrigado a empregar-se muito novinho como aprendiz de compositor tipógrafo na antiga Papelaria Fernandes.

Aos 17 anos foi para Lourenço Marques com a sua mãe e depressa se empregou numa Tipografia. Aos 20 anos regressou a Lisboa e empregou-se na Tipografia Evangélica das Janelas Verdes, chamada "Imprensa Limitada", ligada a uma imprensa de Londres.

Começou como compositor, depois revisor, chefe de turno e mais tarde chefe geral. Imprimiam-se ali Bíblias e Novos Testamentos, Porções soltas de Evangelhos, Epístolas, literatura evangélica. Esta Tipografia trabalhava para muitas Igrejas Evangélicas. Numa determinada altura receberam urna importante encomenda de Novos Testamentos em Português e Espanhol. O título da encomenda era "Mílíon testament". Fez a revisão das duas encomendas tendo o trabalho saído com o maior êxito. Ensinou a arte gráfica a seu cunhado Nascimento Freire e mais tarde a muitas outras pessoas, de entre elas a Abel Pinheiro Rodrigues.

A Imprensa de Londres resolveu suspender o serviço em Portugal, em 1932. A Papelaria Fernandes, logo que teve conhecimento mandou-o chamar, permanecendo aí por cerca de 30 anos.

Simultaneamente, enquanto trabalhava de dia, á noite evangelizava. Colaborava na sua Igreja (Amoreiras), dirigia muitas vezes a Escola Dominical. Dirigiu a Escola Dominical de Almada, anos e anos. Pregava na Igreja de Alvaiade e durante anos deslocou-se a Sines, uma vez por mês, para pregar na Igreja daquela vila. Pregava na Igreja da R. Maria Pia e em muitas outras Igrejas em Lisboa.

Colaborou com a Igreja de Amadora e ajudou o Dr. Colin Bowker na sua formação.

Entretanto, e desde 1932 também, começava o trabalho de evangelização na zona de Sintra. Abriu salas de culto em muitos lugares e levou a palavra de Deus a: Tojeira Aldeia Galega, Vila Verde, Codiceira, Nafarros, Gouveia, Mucífal, Assafora, etc. A todos estes locais se deslocava a pé, ou de bicicleta, em carros velhos, em carros mais novos, de táxi, perdendo muitas vezes o comboio para voltar para casa. Chegou a dormir nos bancos da Estação ou num táxi de um amigo que tinha em Sintra.

Ainda lhe restava tempo para visitar doentes nos Hospitais. Fez estas visitas até aos 84 anos. Visitava presos. Pelos locais por onde evangelizou havia muito analfabetismo e então dedicou mais uma parte do seu tempo ensinando a ler e a escrever. Contava que um dos seus melhores amigos tinha 64 anos de idade.

O trabalho de evangelização em Sintra durou até 1982, ou seja: 50 anos de amor e dedicação e desejo de servir o Senhor. Muitos obreiros o ajudaram nesta obra e de entre muito se podem mencionar: Guido de Oliveira, José Ilídio Freire, Paulo Valon, Paulo Torres, Celestino de Oliveira, José Martins da Costa, Mário Pedro, Abel Rodrigues, Alfredo Machado, António Santos, José Bravo, Augusto Esperança, Augusto Esteves e alguns irmãos da Assembleia de Deus. Alguns destes obreiros já partiram para o Senhor.

Editou durante 12 anos um Calendário Bíblico, trabalho que ele retomou do pastor inglês George Howes. Teve grande aceitação, vendendo muitos exemplares para as ex-colónias, Continente e lhas. Algum lucro que tinha com esta venda, era aplicado na causa do Senhor. A sua vida foi uma vida de dádiva para com os outros. Nada possuía, senão uma alma rica de amor para com os outros e para com Deus.

Nas oficinas onde trabalhou, nas ruas, nos hospitais, nos transportes, ele falava da Palavra de Deus. Poucas horas antes da sua partida para o Senhor, falou de Jesus ao seu bisneto David. Minutos antes da sua partida, absolutamente lúcido e calmo, não se adivinhando que tal iria suceder, sua filha observou que ele estava orando. Fiel até ao fim da sua vida.

Nas suas muitas Bíblias que teve ao longo de 80 anos e que tinham muito uso, poderemos ler e encontrar verdadeiros testemunhos da grande fé que ele tinha em Deus. Há anotações muito belas e são verdadeiras inspirações. Teve momentos de solidão também, mas em todas as situações dava Glória a Deus. Numa das Bíblias, a que medeia entre 1960 e 1970, aproximadamente, pode ler-se na capa: "FALA SENHOR, PORQUE O TEU SERVO OUVE" e há depois uma citação: Êxodo 3:12 - "E Deus disse: CERTAMENTE eu serei contigo". E o Senhor esteve com ele até aos últimos momentos da sua vida.

Colaborou nas Convenções Beira Vouga durante alguns anos. Fez parte de duas campanhas de Billy Graham. Colaborou e foi um dos grandes impulsionadores dos Acampamentos Caravela, em Vila Nova de Milfontes.

Não possuía bens terrenos, vivia do seu pequeno ordenado e de um subsídio de 40 libras que provinha de Inglaterra, através do seu cunhado José Ilidio Freire, o qual acabou quando este faleceu. Era com este subsidio que ele pagava os transportes, muitas vezes as rendas das salas de culto, etc.

Aos 82 anos foi chamado por uma tipografia para fazer um trabalho de grande responsabilidade. Pagaram-lhe e ele entregou o lucro desse trabalho a uma Igreja Evangélica. Nunca pediu a qualquer Igreja que o ajudasse. Confiou sempre no Senhor, e de uma maneira ou de outra, Deus estava com ele e superava todas as dificuldades.

Era casado, pai de duas filhas, avó de quatro netos e bisavó de cinco bisnetos. Todos o amavam. Contava muitas histórias, histórias verdadeiras, episódios da sua vida, acontecimentos do dia a dia, de tal maneira extraordinários, onde se podia ver que a mão de Deus estava presente. Muitas pessoas se converteram através da sua palavra. Baptizou muitos, casou muitos jovens e dirigiu muitos funerais.

Foi residente do Lar Marínel, do Exército de Salvação durante dois anos e meio, e a seu pedido, tendo como a principal finalidade evangelizar naquele meio, enquanto podia servir ao Senhor, pois devido ao seu coração estar fraco, depois de um enfarte que teve em 1984 e não poder sair sozinho, poderia fazer ali algum trabalho. E de facto fez. Algumas almas se converteram através dele.

    Notas tiradas de muitos documentos escritos por Luís Paiva, das suas Bíblias, e de um pequeno resumo da sua vida, escrito por ele próprio em Março de 1988. A juntar, o conhecimento profundo da sua vida, através das suas filhas e mulher.
    - Loide Paiva de Oliveira, 3 de Setembro de 1990.

JÚLIA FREIRE DAS NEVES PAIVA

Júlia Maria Carolina Freire das Neves Paiva, partiu para o Senhor em 30 de Setembro de 2005, e faria 100 anos em Fevereiro de 2006. Era viúva de Luís das Neves Paiva, dedicado obreiro e missionário evangélico, cuja actividade se desenvolveu na zona de Sintra, ao longo de mais de 50 anos, onde deixou uma obra destacada. Era também irmã dos conhecidos obreiros José Ilídio Freire e Nascimento de Jesus Freire, ambos já falecidos. Vive ainda o seu irmão Licínio Freire.

A sua infância e juventude foram passadas em ambiente evangélico, onde recebeu os princípios cristãos que regeram toda a sua vida. Casou e teve duas filhas, assim como vários netos, bisnetos e até um trineto.

Esta Irmã acompanhou fielmente o trabalho evangélico de seu marido, estando, sempre que possível, presente nas suas várias actividades de evangelização. Dirigiu por vários anos a casa de Férias da União Cristã Feminina, situada primitivamente no Carrascal e mais tarde no Vinagre, povoação perto de Colares, onde senhoras de várias Igrejas Evangélicas passavam férias, um trabalho iniciado pela D. Laura Morton, grande impulsionadora do então conhecido movimento ACM, para Jovens do sexo feminino.

Foi regente do Seminário Prebisteriano de Carcavelos durante alguns anos. Ensinou durante cerca de dez anos na Aliança Pró-evangelização de Crianças (APEC), trabalho fundado em Portugal no ano de 1954, pela missionária D. Violeta Lopes, com quem trabalhou. No entanto, a sua colaboradora mais próxima era a D. Antonieta Marques, de quem se transcreve a seguir um sentido testemunho:

«Recordo com saudade os anos que caminhamos juntas na evangelização das crianças. Nunca se queixava, se havia frio ou calor; o Senhor mandava avançar e lá íamos para as classes da APEC, em Lisboa, Vila Verde, Carrascal, Mucifal e Nafarros, no Concelho de Sintra.

Muitas vezes o nosso transporte de regresso para Sintra era de carroça da nossa saudosa Irmã Deolinda de Nafarros. Com que alegria a Júlia Paiva me acompanhava e me ajudava. Ficava tão feliz quando uma criança aceitava o Senhor Jesus.

Em sua casa recebeu uma missionária que se destinava a ir para Espanha para trabalhar com a APEC. Esteve em Portugal algum tempo e em casa da Júlia esteve também o depósito de Literatura da APEC, que a missionária dirigia. A sua dedicação ás reuniões de oração da APEC era extraordinária. Era uma mulher de oração! A palavra do Senhor nos fala de mulheres que serviram o Mestre com todo amor, e os seus nomes ficaram registados na Escritura.

O nome da Júlia pode ficar neste painel de Mulheres que O serviram. Júlia - Combateste um bom combate guardaste a fé e foste fiel, e agora gozas a presença do Senhor que tanto amaste. Peço ao Senhor que levante muitas Júlias da mesma fibra, com a mesma dedicação, com o mesmo amor, fé e paixão pela almas, levando-as aos pés do Salvador.”

Apesar da sua avançada idade, lia diariamente a Bíblia e o livro “Meditando”, seu preferido. A sua vida foi sempre testemunho de uma verdadeira crente, tendo dito poucos dias antes de falecer que estava pronta para partir para Jesus».