|
|
|
|
Durante os 56 anos que residiu em Ponta Delgada, S. Miguel, Açores, trabalhou activamente na causa gloriosa da evangelização das almas, sendo coadjuvado sempre pela sra D. May Hove Carnaíl Cox, sua dedicada esposa.
Nas primeiras duas décadas, os meios de transporte, eram muito escassos. As camionetas de passageiros e automóveis de aluguer só começaram a aparecer na segunda década. Contudo, isto não era obstáculo para viajar, fazer visitas e anunciar a Palavra em muitos lugares. Calcular quantos quilómetros foram percorridos a pé, de bicicleta e de char-à-bancs, é impossível. Naquele tempo a correspondência demorava muito tempo para chegar e, às vezes, nunca chegava. Muitas das facilidades de hoje eram privações naquela altura. A maior parte das localidades da ilha de S. Miguel, a maior dos Açores, foi visitada. Muitas pessoas não sabiam ler, mas, ainda assim, a literatura de evangelização, e diversas porções bíblicas, ficavam com as pessoas interessadas e eram-lhes remetidas pelo correio quando havia fome e sede para tal. A perseguição era, por vezes, rude como rudes eram os tempos, mas o que importava era estar vivo para testemunhar do Senhor Jesus. Os desacatos e prejuízos eram cavacos do ofício, como se diz nos Açores.
Cumprindo o mandato de pregar o Evangelho a toda a criatura, o sr. Cox viajou muitas vezes para as outras ilhas, principalmente para as ilhas do grupo central. Os Açores têm nove ilhas divididas por três grupos: o grupo central tem cinco, e o oriental e o ocidental, duas cada um. Ali demorou-se, em certas ocasiões, muitos dias. As ilhas onde mais trabalhou, além de S. Miguel, foram Pico, Faial, Graciosa, Terceira e S. Jorge. Nesta última chegou a realizar um serviço de baptismos quando nove crentes desceram à água no dia 25 de Agosto de 1938. Três destes crentes têm anunciado a Palavra a par das actividades de sua vida. Os locais assim Visitados, e o contacto permanente com as pessoas interessadas no Evangelho, têm fornecido a base para a continuidade e o início dos trabalhos regulares que, actualmente, existem em algumas destas ilhas.
O serviço epistolar de evangelização era bastante para ocupar todos os dias e serões da vida do sr. Cox. Jamais se poderá dizer quantas cartas escreveu para esclarecer, ajudar, edificar e consolar no Senhor tantas almas nestas ilhas. Fez muitos estudos bíblicos e não cessava de anunciar o Senhor Jesus pelas casas.
As suas orações eram repassadas dos mais profundos e tocantes sentimentos cristãos. Quem teve a dita de o ouvir e orar não pode esquecer tão sublimes quão impressionantes súplicas. Era de facto a oração de uma alma absolutamente cônscia da comunhão com Deus. Ele sabia que o Senhor estava ali. Quando visitava, ou era visitado, a despedida era uma oração ou concerto de oração. Frequentemente orava de joelhos.
Durante toda a sua vida cultivou sempre o espírito de jovialidade, sendo alegre e comunicativo com jovens e velhos. Por toda a parte ensinava hinos e coros de acordo com a música, tal qual ela é. Organista exímio, era também cantor primoroso. Compôs muitos coros extraídos de textos bíblicos e outros para Vincarem as grandes realidades da salvação e a vida eterna com Cristo. Ao ensiná-los, primeiro salientava tais verdades, usando sempre as mais conspícuas e corroborativas figuras bíblicas. Muitos deste coros, mandou-os pintar em telas brancas que colocava perante os auditórios que os aprendiam ávida e rapidamente. Existem dois hinários, por ele editados mais de uma Vez, que reúnem a maior parte dos coros de sua autoria e outros de versão e adaptação: "Coros Evangélicos" e " Coros Bíblicos" com 405 e 41 coros, respectivamente. Têm sido usados em Portugal, Brasil e África Portuguesa. Nos Açores vulgarizaram-se nas congregações. Os coros baseados em S. João 5:16; Actos 4:12: Salmo 119:18 e 51:15; 5. João 10:9; II Coríntios 5:20, 21; Efésios 2 :8, 9; etc. são predilectos da maior parte dos crentes antigos.
Os esboços de sermões e estudos bíblicos do sr. Cox encheriam alguns úteis e interessantes volumes. Não era orador fluente ou empolgante, mas a profundidade espiritual e bíblica de suas mensagens excedia a oratória oca e ruidosa que não vai além do tímpano. A imponência do seu porte correcto salientava-se no púlpito infundindo respeito e reverência.
Senhor de vasta cultura bíblica, possuía uma biblioteca ricamente seleccionada, onde se encontravam os melhores trabalhos dos melhores autores cristãos ingleses, cobrindo uma copiosa gama de assuntos bíblicos e teológicos.
Dispunha também de uma óptima biblioteca em língua portuguesa, cujos livros, além do uso que deles fazia pessoalmente, emprestava e fazia circular entre amigos e interessados. Estava constantemente em contacto com editores evangélicos de Portugal e do Brasil, divulgando e distribuindo, regularmente, os melhores livros, tratados, jornais e periódicos publicados. Recebia muitas revistas e jornais ingleses e estadunidenses que o punham ao corrente dos movimentos e evoluções evangélicas através do mundo. Quando visitava a Inglaterra aproveitava assistir a algumas Convenções onde representava o sector evangelístico açoreano.
Nunca pôs em foco as suas dificuldades, privações, desgostos e tribulações. Tudo isso pertence ao capítulo de suas acções discretas, como acontecia com a caridade que exercia. O aparecimento de outras denominações com as injunções sectaristas e atritos costumeiros, a rudeza e a deslealdade de alguns falsos amigos, as perseguições em vias de facto, as viagens precárias entre as ilhas, os horrores da Segunda Guerra Mundial, quando os dois filhos e a filha se encontravam na encha-meada Inglaterra, tudo isso e o que aqui não registamos, e o mais que só Deus sabe, contribuiu e resultou no caso cardíaco que o vitimou.
Durante a sua permanência em Ponta Delgada, mais de uma vez foi substituto do Cônsul inglês. Sendo obreiro evangélico era, vulgarmente, apodado de " padre dos protestantes ". Era visita de algumas pessoas ilustres e era considerado e respeitado por todas as pessoas de bem pensar e bem tratar. Em toda a parte prestigiou a obra evangélica e dignificou o nome que é sobre todo o nome, o Nome de nosso Senhor Jesus Cristo.
Como já referimos, a esposa foi sempre uma auxiliadora incansável, distinguindo-se no serviço da evangelização, palestras domésticas, cuidados medicinais e visitação metódica. Conhecedora de medicina e experiente em enfermagem, atestada com vários diplomas, popularizou-se nos Açores, sobretudo na ilha de S. Miguel, com as consultas semanais e remédios homeopáticos que distribuía. Instilando fé no Senhor e recitando textos e passagens bíblicas, espalhava o bom ânimo e conforto espiritual por toda a parte em verdade e caridade. Vive em Inglaterra desde a partida do sr. Cox para a Eternidade, porém a saudade dos Açores é inextinguível em seu coração como provam as Visitas que, de dois em dois anos, tem realizado além das missivas cordiais que escreve. Não é possível esquecer as vissicitudes de 56 anos compartilhadas e gravadas, na carne e no coração, com alegrias e tristezas, num campo de muitas flores e muitos espinhos.
Terminando o registo destas notas biográficas e preito de honra a quem honra, e sentindo a saudade avolumar-se em nosso coração, olhamos para o dia em que de novo vamos encontrar-nos, para não mais nos separarmos, perante Aquele que é Senhor de toda a honra e glória. Os seus servos O servirão e verão o Seu rosto. Os entendidos pois resplandecerão, como resplendor do firmamento; e os que a muitos ensinam a justiça refulgirão como as estrelas sempre e eternamente. (Daniel 12:5).
O sr. Cox, pouco antes de partir para o Senhor, dirigiu a seguinte mensagem aos crentes que ele muito amou: "Estou convencido do próximo fim desta dispensação, convém, pois, que nós, crentes, nos entreguemos totalmente ao Senhor, procurando em tudo fazer a Sua Vontade." Recomendou a leitura das seguintes passagens bíblicas: Colossenses 5:1-4; Efésios 5: 1, 2 e Romanos 12:1, 2.
Por J. L. Carreiro, da Igreja Evangélica de Ponta Delgada. |
|